domingo, 14 de julho de 2013

Cada um com seu cada um.

Vejo graça como as pessoas, de uma forma geral, se preocupam com os médicos.
Acredito que seja uma atenção desproporcional á classe.
Nem merecemos tanto!
Preocupam-se com o quanto que ganham os médicos, se merecem ou não o valor que recebem, se tem carro do ano, se viajam para o exterior, se moram em prédios chiques, se têm casa própria, enfim.
Crucificam aqueles que recusam ir ás estâncias mais longínquas para atender, que recusam os "altos salários" oferecidos para trabalhar em locais onde ninguém quer trabalhar, chamam de mercenários, de "playboys e patricinhas".
Especulações das mais descabidas.
As reivindicações da classe são legítimas: por melhores condições de trabalho, por uma remuneração condizente com a importância e a extensão do que realizam, por respeito.
Cada um que lute pelo sua própria causa.
Cada um que lute pela sua classe.
É um direito que cada um tem.
Achincalhar a luta alheia é perversidade.
Só quem vive a medicina do SUS do país e sente na pele (e na alma) os efeitos que ela produz , pode levantar a voz para bradar algo a respeito.
Quem nunca abriu um livro de medicina, nunca passou horas estudando, perdeu noites por isso, nunca ficou 12, 24, 36 ou 48 horas trabalhando, com períodos mínimos de descanso- me perdoem- não tem direito a falar.
Opiniões só contam com embasamento, com experiência. "Achismos" não tem valor.
Se os altos salários fossem realidade, as pessoas estariam se estapeando para ir ao encontro da proposta imperdível.
Se as condições de trabalho fossem boas, as pessoas jamais pediriam demissões de seus empregos e seria fácil encontrar substitutos para aqueles que partiram.
É tão simples compreender, que fica pedante seguir explicando. É óbvio e ululante.
Acontece que, além do trabalho extenuante - porque a população a ser atendida excede (muito) em número a totalidade de vagas que o sistema oferece- ainda há a incapacidade de resolução dos problemas que aparecem. Não por falta de médicos, mas por falta de leitos, de medicações, de laboratórios, de exames, de lençóis, de sabão para lavar as mãos e papel toalha para secá-las.
Fica difícil aceitar a morte de alguém toda semana, todo dia, por não ter estrutura para manter a vida, mesmo que o salário seja gordo.
Fica difícil aceitar um emprego e ser assaltado na porta de entrada, receber ameaças dos usuários que comandam as "bocas" e determinam quem sai e quem entra no bairro.
Fica difícil trabalhar quando o salário atrasa e se torna necessário mais 2 ou 3 empregos para pagar as contas de casa.
Medicina é dom, arte, ciência, mas não é sacerdócio.
E sacerdotes (padres e pastores) também têm salário, para quem não sabe.
Faz-se sim, por gosto e por amor, mas apenas gosto e amor não pagam as dívidas, tampouco põe comida na mesa.
Outros tantos profissionais também sofrem as consequências da miséria deste país: policiais que escondem a farda para preservar a própria vida e a família, que aceitam "bicos" como segurança, porque o salário é insuficiente para manter os custos; professores que são destratados com um pagamento de fome, acumulam vínculos empregatícios para pagar as contas e ficam cara a cara com a pobreza, a falta de respeito e um sistema de educação falho e mal organizado.
Cada um tem o direito (e o dever) de lutar pela própria causa.
Buscar melhorias para si e para a classe a qual pertence.
Já comprei remédio para paciente que não tinha dinheiro para se tratar, já internei porque não tinha comida em casa, atendi mesmo sabendo que não havia lugar para o paciente permanecer, troquei medicamento porque o desejável estava em falta, fiz gambiarra em respirador para que funcionasse e rezei, rezei muito para que Deus tivesse misericórdia de todos nós.
É um país gigante, com uma distribuição de renda injusta, uma desigualdade social gritante e políticos corruptos que se beneficiam da pobreza da população.
A classe médica é apenas mais uma a ser pisada e quer, de alguma forma, fazer valer o direito que tem (ou quer ter).
A crítica gratuita é desnecessária. Seja por  inveja ou recalque, também não sei, não importa.
As faculdades estão aí: públicas, particulares, de portas abertas a quem quiser entrar na medicina.
E diga-se de passagem , a trabalhar para o governo de forma obrigatória por 2 anos.
Qualquer um pode. É só querer. Desistir sem  tentar é no mínimo covardia.
Depois, de passar por tudo, de experienciar cada situação, cada dia, mês e ano, pode sim falar  à vontade, com embasamento e verdade.
Por enquanto, cada um tomando conta da sua própria ocupação, já é suficiente.






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